Faz hoje 34 anos, num quartel militar, não muito longe da minha aldeia, um conjunto de certezas e incertezas deverão ter-se cruzado faiscando entre os olhares assustados dos soldados, e os olhares talvez mais decididos de alguns oficiais, à hora do jantar, o qual deve ter caído que nem calhaus rolados... naqueles estômagos... agora tão apertados!. Um capitão, jovem e corajoso, em breve deixaria a capital da lezíria rumo à dormente Lisboa, nostálgico centro de um império esvaído. E sobre o orvalho da manhã, no empedrado das ruas do chiado, aqui conquistou a imortalidade, entre a galeria dos heróis mais merecidos deste país. Nessa manhã, esperámos, como o fazíamos sempre, pelas senhoras professoras da minha escola primária, hoje quase vazia, mas então cheia de criancinhas, de uma “baby boom generation” que hoje já deu os primeiros passos nos quarenta. Nessa altura ainda não lhes chamávamos “setôras”. Nesse ano, fazia a minha quarta classe, penosamente, entre o conhecimento da produção de cacau de S.Tomé e Príncipe e o nome das localidades servidas pelo caminho de ferro de Benguela, de um pseudo-Portugal distante mas que, todavia, tínhamos a certeza existir. Pois por vezes íamos a Lisboa chorar, por simpatia com o povão sofredor, a partida de tios e primos para a guerra, nos paquetes do cais de Alcântara, apinhado de gente e de lágrimas. Lembro-me, com se fosse hoje, que conhecíamos as professoras pelas cores dos elegantes sapatos que usavam, distintivos da sua posição entre o povo boçal, no tecido rural deprimido situado à volta da escola. Então, esperávamos que chegasse a camioneta de carreira da Setubalense, riscada de verde, com umas janelas traseiras arredondadas, enormes, em vidro amarelo transparente. Por cima do tejadilho, uma carga sempre generosa, presa com uma enorme rede de nylon. Estas camionetas ligavam a minha aldeia ao mundo e o mundo à minha aldeia. Nessa altura o mundo começava e acabava, a 45 km, em Vila Franca de Xira, início e fim de linha, .
A minha professora da quarta classe, desde que começara a namorar com o Sr. da carrinha dos livros (biblioteca itinerante da Gulbenkian), tornara-se mais elegante, usava uns sapatos amarelos, ou castanhos (em alternativa). Começara a sorrir e até nos dava menos reguadas. E até começou a usar baton vermelho-vivo nos lábios, que só víamos às actrizes, em luz, no único cinema domingueiro da aldeia. Sim, a minha aldeia teve um cinema muito cedo fruto da teimosia de um velho comerciante esclarecido e ousado. Levado pela mão do meu tio João, aprendi tanto ou mais naquele cinema do que na escola.
Ainda que fosse uma rotina instalada desde há muito, esperávamos então que os passageiros descessem todos e, do outro lado da paragem, íamos confirmando as cores dos sapatos descidos, no campo visual rectangular, por baixo da enorme massa metálica da camioneta da carreira.
Nessa manhã de Abril, desceram botins de borracha, sapatilhas de trapo, botas novas e botas velhas, sapatos de homem engraxados, e menos engraxados, pés descalços também. Mas sapatos de salto alto, de verniz e cores vivas, nem vê-los. As professoras faltaram todas (!)
Depois do autocarro ter prosseguido a sua marcha, rumo ao centro da aldeia, situada uns duzentos metros mais acima, após uma cautelosa confirmação visual, uma explosão de alegria atravessou a turba estudantil, ainda incrédula com o que tinha acontecido nessa manhã tão extraordinária de Abril. Adivinhava-se um dia de correrias, jogo da bola, fisgadas nervosas e trogloditas nos pássaros do chaparral que, nessa altura, envolvia a escola. Enfim brincadeira gorda que, de facto, aconteceu.
Uma das funcionárias da escola, chegara-se muito aflita, e entre a chilreada incontrolada teve de gritar: “hoje não há escola, vem aí a liberdade!”.
Nesse dia, depois das calorias gastas, fui para casa a pensar como seria a liberdade? Que coisas maravilhosas teria para nos ensinar? Continuaria a humilhar os meus colegas com mais dificuldades, colocando-os com orelhas de burro em cartolina, à janela da sala? Seria capaz de nos ensinar a todos? Ela sozinha? Que histórias teria para nos contar? E a aritmética? Como ensinaria ela a odiada aritmética? Juntaria os meninos com as meninas?
Mais importante ainda, de que cor seriam os seus sapatos?
Dois dias depois, que nos pareceram duas semanas, um grupo inquieto de criancinhas esperou ansiosamente, no outro lado da paragem, a caminoneta da carreira da Setubalense, com o seu enorme lagarto pintado na chapa grossa. Lá nos inclinamos em reverência oriental, espreitando por baixo do machibombo (nome de autocarro que o meu tio Custódio, militar em África, já me tinha ensinado). Desceram os botins de borracha, as sapatilhas de trapo, os sapatos, as botas, novas e velhas e…espanto nosso (!), em cadência de relógio de cuco, o par de sapatos de salto alto amarelos (os da minha professora !), os brancos, mais uns brancos, uns azuis, uns beges e uns pretos, outros pretos. Céus! Quando a camioneta abalou, perante os nossos olhos esbugalhados, as respectivas professoras estavam dentro deles.
Passada a desilusão, (se calhar igual à de hoje), que uma liberdade, mulher talvez bonita e providencial, como são as nossas mães, nos iria salvar a todos, arrancando-nos das profundezas da ignorância, em lições doces dadas entre sorrisos sábios…retomamos as aulas rotineiras até a final do ano e até ao exame final. A minha ingenuidade infantil morrera ali. Mas tinha-me custado tanto como a “morte” do pai Natal, quando aos cinco anos descobri que aquela bicicleta vermelha que recebi cuidadosamente embrulhada com uma enorme fita azul, em papel brilhante, afinal, tinha sido comprada pelo meu dedicado pai. Chorei que me desalmei nesse dia de revelação trágica, às escondidas.
Mas depois de Abril de 1974, a parte melhor, é que deixamos de decorar as toneladas de produção de cacau e de sisal do arquipélago de S. Tomé e Príncipe…e as estações do caminho de ferro de Benguela e outras abstracções e idiotices. Quanto à liberdade, penso que ainda andamos todos atrás da sua configuração, da sua verdadeira forma…e que ela nos foge sempre como um pequeno animal selvagem, assustado, à frente das novas tiranias, das quais, diga-se em boa verdade, também não conhecemos lá muito bem as suas formatações. Para grande azar nosso e do futuro que queremos preparar para os nossos filhos.
Leonardo Charréu, 34 anos depois, 25 de Abril de 2008 em Glória do Ribatejo
Memória lida no 20º Encontro da APECV
(Associação dos Professores de Expressão e Comunicação Visual
na Faculdade de Belas Artes da Universidade de Lisboa
Viva Baudolino
Por fim lá consegui uns minutos entre o montão de coisas em mãos, até ao verão
Visitei o teu blog e não consegui "comentar" (problemas técnicos). Então comento aqui.
Obrigado pelas palavras simpáticas relativamente ao meu blog.
As luzes acesas...os faróis de mar, sempre me fascinaram. Tão precisados que estamos, todos nós, de orientação, no meio das incertezas que nos lançam no caminho. A propósito, até gosto daquelas lanternas de zinco (tenho mais de dez) fabricadas (ao que parece) por mãos escravas, a escassos cêntimos de dólar (ou Euro) a unidade, algures no oriente, e vendidas, multiplicadas por muitos, nas lojas multinacionais da moda, onde gostamos de comprar, inconscientes e felizes, antes da crise rebentar,dando estupidamente continuidade à tirania longínqua. Consolar-nos-emos na escrita, caro amigo, até a tempestade passar.
Até Breve
um abraço
do
SEMPER QVAERENS
Nasci e cresci feliz numa aldeia. Como qualquer menino socializei-me e aculturei-me no sotaque característico da minha terra, que descobrimos ser sempre tão particular, à posteriori, quando nos confrontamos com a oralidade e a escrita da chamada alta cultura que nos vai aparecendo ao caminho.
Brinquei, pulei, joguei à bola, subi árvores, descobri incontáveis ninhos, apoderei-me de não menos numerosas crias, roubadas estupidamente aos progenitores, entre chiadeiras aflitas, a que tinha o mórbido prazer de alimentar e ver crescer…numa gaiola, diligentemente construída para o efeito.
Melros, gaios, pintassilgos, nada me escapava. Aves que cada vez se vêm menos aqui pelos campos, agora monotonamente eucaliptizados. Salva-se, ainda, o ar puro a eucaliptol. Ao menos isso. Hoje entristece-me ver um pássaro preso. Remorsos de outrora, ampliados pela consciência ecológica que julgo ter cultivado.
Pois bem, disponho-me hoje a falar-vos da minha primeira experiência como “craftsman” de fisgas. “Atiradeiras” como aqui na aldeia chamavamos a essa popular arma de arremesso.
As fisgas eram um acabado exemplo de refuncionalização criativa de desperdícios, algo que a actual sociedade do hiperconsumo desconhece completamente. Uma boa fisga dependia da qualidade da forca, (as de madeira de marmeleiro eram as melhores) da natureza da borracha (as vermelhas, das câmaras de ar das rodas bicicletas) e da maleabilidade do cabedal (o melhor cabedal era o que era cortado das “línguas” das botas velhas) onde se puxava a pedrinha rolada que, nas mãos de qualquer atirador exímio, transformava-se numa arma letal. Pelo menos para pássaros, rãs e animais rastejantes que passassem ao alcance. Com os meus nove, dez anos, estava completamente siderado pela capacidade da arma que via ser fabricada e manejada com destreza pelos mais velhos da meia geração seguinte. Depois de tanto ver, e tanto desejar, um dia resolvi fazer uma fisga. Lá pus os meus olhinhos a mirar os marmeleiros da fazenda, até encontrar a bifurcação de ramos desejada para a forca, a navalhinha, sempre omnipresente, no bolsinho da minha indumentária surrada, fez o resto. Ouvi uns ralhetes justos e oportunos dos meus avós. Aquele marmeleiro dava gamboas, uns marmelos tão grandes e tão doces que valiam por um almoço. Pois agora tinha-lhe amputado uns membros sadios para alimentar a minha obsessão.
Depois, procurei pela borracha da câmara de ar irrecuperável, ao Sr. Humberto, o mecânico da oficina da aldeia, e sacrifiquei a “língua” de cabedal de umas botas de inverno, quase novas, que me custou uns tabefes, muito bem dados pela minha mãe.
Lá arranjei um fio qualquer de atar, no cesto da costura, cada vez mais acelerado na ânsia de me ver ao mesmo nível dos outros e de participar em incontáveis batalhas e bem-aventuradas caçadas. Arma pronta. Experimentar.
Procurei o projéctil mais redondinho entre os seixos da estrada poeirenta (o alcatrão à minha aldeia chegou muito tarde). Aconcheguei-o no cabedal, entre as borrachas, como o caçador de elefantes que beija a bala fatal (tinha visto esta cena num filme). Estiquei, estiquei, estiquei, com maior potência braçal possível. E zás plás, uma das borrachas desprendeu-se da forca e esbofeteou-me violentamente na cara. Dei um grito de dor, vi muitas estrelas a orbitar em meu redor, e fiquei durante alguns minutos a tentar saber o que se tinha passado. Na ânsia de obter a minha arma o mais depressa possível, tinha prendido a borracha à forca com lãs, em vez da regulamentar guita forte, de atar chouriços. Erro fatal.
Ainda me vem o sabor a borracha, na boca, quando hoje vejo uma fisga, mesmo aquelas moderníssimas, de forca metálica, em alumínio, e borrachas redondas esverdeadas, com que os pescadores no despoluído Sorraia atiram asticot para enganar os peixes do rio.
Bem informado por uma amiga (bem hajas Supi) gostava muito, mas mesmo muito, de ter o talento para escrever o que se pode ler em:
http://www.saladosprofessores.com/forum/i
Os textos talentosos são para se mostrarem e divulgarem.
Mas o pior...o pior....o pior....É que todos nos revemos neste esquema de mentira "industrializada".
O país, todo ele, em muitas coisas precisa de divã psiquiátrico. É o que é....
Lembro-me que, há três décadas atrás, sempre que os conteúdos violentos se extremavam, nas imagens televisivas, raramente transmitidas em directo, pois eram editadas, surgia quase sempre um(a) jornalista com o ar mais grave do mundo, recomendando às crianças, às pessoas mais sensíveis e impressionáveis, aos doentes cardíacos etc., que se abstivessem pura e simplesmente de as ver. O texto que também passava na vertical do écran, de baixo para cima, dizia o mesmo, num estilo bold, muito branco sob um fundo preto, numa televisão que também só se apresentava tristemente a preto e branco. Julgo que o efeito, em muitas pessoas, sempre foi o contrário. A minha mãe via-as entre os dedos, enquanto eu as mirava de olhos esbugalhados, arriscando muitas noites de insónias. Eram as touradas mal sucedidas, as brigas do hóquei sob o gelo (esse desporto tão distante), acidentes rodoviários e ferroviários brutais, crimes inusitados. A mudança que ocorreu desde então, até chegarmos aos dias de hoje, foi quantitativa e qualitativa.
A guerra, violência institucionalizada, passou a ser espectáculo com direito a interrupções televisivas para ser anunciada, tal como os corpos anónimos lançados em queda livre, para a morte, do alto das Twin Towers nova-iorquinas. Ou ainda os corpos de mulheres e crianças que se despedaçam regularmente nas ruas caóticas de Bagdad, ou Bassorá, entre explosões e chapa retorcida de automóveis e autocarros, que passaram a ser recorrentes e demasiado frequentes no troco que a administração americana, acto contínuo, exigiu. Estas imagens, e outras, que povoam diariamente o nosso espaço mediático, passaram a fazer parte de um reportório que se bestializa de forma crescente sem que, aparentemente, a humanidade pare para pensar. Tornaram-se rotina nos noticiários das oito enquanto meia humanidade continua calmamente a comer a sopa…como se nada fosse.
[Excerto da comunicação "When you are pushed, killing´s as easy as breathing”*- Cultura Visual, Violência e Cinema: Sobre a necessidade educativa de analisar criticamente as imagens da cinematografia contemporânea" a apresentar brevemente no Congresso Ibero-americano de Educação Artística, (ver Links/acontecimentos)]
Por vezes temos que passar por algumas experiências para poder dar mais sentido e valor às novas. Nos meados dos anos oitenta comprei, a prestações (!) uma máquina de escrever “Made in RDA” de cor azul cinza, num estojo preto, anti-choque. Este foi então um extraordinário património para um rapaz da aldeia, que se cultivou numa carrinha Citroen, de chapa ondulada que vinha cheia de livros, de tempos a tempos, ao centro da terreola “trazer o mundo”. Na chapa lateral “Fundação Gulbenkian Biblioteca Itinerante”. E lá dentro, um cheiro quente a livros que não mais esquecerei.
Enquanto os meus companheiros iam deixando a escola e oleando e limpando com desvelo as famosas Famel Zundapp XF17 Super, compradas a setenta e cinco contos (!) com as primeiras sofridas economias do trabalho, na construção civil, eu ia oleando, com igual devoção, a minha máquina de escrever.
Pouco tempo depois, num viagem épica a Andorra que, juntamente com a norte- africana Ceuta, constituíam as cidades santas das compras, “a um terço do preço”, da minha juventude, completei o meu património “Made in RDA” com uma máquina fotográfica Praktica Reflex MTLB5. Julgo, sem grande erro de me enganar, que milhões de fotógrafos se devem ter formado neste aparelho, com o qual tirei as minhas melhores fotografias até hoje.
Para os meus visitantes mais jovens, menos conhecedores da geopolítica europeia que marcou a geração que já vai nos quarenta, a RDA é o acrónimo de República Democrática da Alemanha, na altura em que uma cortina, que alguns diziam ser de ferro, separava os países comunistas da Europa livre.
Era um país que aberbatava a maioria das medalhas em competições desportivas, sabendo-se hoje a razão porque as suas atletas tinham “voz de homem”. É que na RDA proliferavam os mais importantes laboratórios de substâncias dopantes.
Bom, voltando à inspiração deste texto, a facilidade com que agora nos metemos no meio de um texto (sem o arreliador corrector branco), o deixamos a “adormecer”, para logo depois voltar a ele…é uma capacidade extraordinária que só quem dactilografou mecanicamente sabe dar valor.
Delas só tenho saudade do tap tap, e do rrrrt da mudança de linha. Dava-me um certo estilo de personagem policial, a escrever os relatório das detenções, momento complementar à fúria do gatilho, das séries televisivas “Serpico” e “Bareta” da nossa única televisão. Enfim, para além da revificação das memórias pessoais, senti mesmo o suplemento de alma de que necessitava.
A propósito, troco uma tela minha de dimensões razoáveis de 80 x 60 cm (sobre esta temática) por uma máquina de escrever Remington mesmo em mau estado. Ficava-me bem em cima do aparador.
Faleceu ontem Charlton Heston, famoso actor norte-americano dos inolvidáveis "Ben Hur" e "Planeta dos Macacos", entre algumas cowboiadas também interessantes.
Do "Ben Hur" a minha costela patriota e ribatejana obriga-me a dizer que na cena da pega do touro, o "duplo" que a faz, no meio daquela poeira toda, de cabeleira postiça enfiada na cabeça, é o "nosso" Nuno Salvação Barreto, um dos maiores forcados que a nossa tauromaquia já conheceu e que, muito corajosa e honestamente, ali foi à procura das famosas notinhas verdes, que então valiam mais!
Sempre considerei Charlton Heston um bom actor.Ter-lhe-ia mais afecto não fosse ele um dos mais acérrimos defensores do armamento civil no seu país. A American Rifle Association, poderosa organização dos fabricantes de armas local deve ter-lhe agradecido os prestimosos serviços prestados à causa de "a gun for every american" . Como sabemos estes amigos americanos são os maiores fabricantes de armas mundiais, uma industria de milhões. Os resultados deste apoio à venda livre estão à vista e reflectem-se nas matanças mediáticas de inocentes, nas ruas, dentro das escolas e universidades - que deveriam ser lugares sagrados,como os templos de qualquer religião - com que somos violentamente confrontados de tempos a tempos, nos Estados Unidos da América. Iniciou-se numa simples escola secundária que pôs um lugarejo - Columbine -no mapa, pelas piores razões, depois na Virginia Tech University, na University of Illinois...onde será a próxima?
Mesmo que que as tuas pistolas prateadas só tivessem disparado pólvora seca, caro Mr. Heston, as verdadeiras, as que existem em rédea livre, na mão e cada cidadão, honesto ou desonesto, disparam balas reais que despedaçam vidas reais...para sempre.
Sempre me impressionou ver nos filmes históricos a caracterização das personagens dos senadores romanos, sempre tão alvos, de toga e cabelos brancos...pose serena e magestática...o discurso sempre tão certeiro, tão sábios, só de ver !
Devem ter sido mesmo assim os senadores da República de há dois mil anos, mesmo aqueles que levaram a faquinha para apunhalar César...esse vaidoso.
Lembro-me, há uns anos atrás, quando realizava um estágio em arqeologia de campo (a minha secreta paixão), de assistir ao vivo a uma peça clássica (julgo que "Electra") nas ruinas mágicas de Conímbriga. Que figuraços, que impacto, as togas brancas, debruadas com duas listas largas roxas, deslizando sob aqueles mosaicos milenares...a colocação de voz dos actores a ecoar naquele planalto, ao final de tarde de um dia de Julho, com uma luz muito laranja, como aquela que, nas nossas memórias, costuma banhar os cenários da nossa infância. Inesquecível.
Conheço poucas personalidades vivas que reencarnem com tanta fidelidade estas figuras tão emblemáticas que a cinematografia histórica por vezes recupera. Uma é a do professor Manuel Patrício, distinto professor da Universidade de Évora já aposentado, da qual foi magnifico (que nome tão romano) reitor.
Pois na noite do último domingo, no recuperado teatro Sá da Bandeira em Santarém, tive o privilégio de ver, ao vivo e a cores, mais um senador romano reencarnado na figura do Senhor Manuel João Barbosa.
Não conhecem os meus visitantes este personagem real? Passo a apresentar.
O senhor Manuel João é o director do Jornal Folclore que comemorou no passado domingo 5 de Abril o seu 12º aniversário no Teatro Sá da Bandeira . Organizando o espectáculo "Raízes" um momento extraordinário de etnografia e cultura popular portuguesa.
Só compreenderemos verdadeiramente a nossa literatura erudita (esplendorosa em Eça e Aquilino)se soubermos apreciar a nossa cultura popular. Eu amo-a, porque nasci no meio dela e ainda tenho o privilégio de a ver quase todos dias porque, teimosamente, continuo a viver na minha aldeia Natal...algures... na margem esquerda da vida e da geografia. Até ver.
Pois o senhor Manuel desliza com suavidade, como aqueles actores de Conimbriga, por uma boa parte dos festivais de folclore do país, os mais genuinos e representativos (porque na realidade há muito lixo supostamente pseudo-folclórico por aí). É uma figura magra, esbelta, discreta, simples, com todas as marcas de quem já passou seguramente os sessenta. Poderia fotografar com uma velha Leica - essas reliquias tão valiosas - Dava-lhe mais estilo. Mas o senhor Manuel já utiliza uma moderna digital. Desconfio que faz todo o Jornal sózinho. Quem é que disse que já não há D.(s) Quixote(s) neste mundo! Bem haja senhor Manuel.
Há cerca de 12 mil crianças em portugal há espera de uma família de adopção e um número bem maior de casais a quem a biologia os negou.
Segundo os jornais, o processo de "custas" para a adopção de uma criança importa em mais de cinco centenas de euros, bem mais do que um ordenado mínimo em Portugal.
As contas são fáceis de fazer nesta vertigem de genuflexão face ao controlo do défice 12.000 x 576=6.912.000 Euros de receitas para o Estado, ainda que seja à conta de quem assume o compromisso de dar um lar, agasalho, carinho e amor a uma criança. Gestos e sentimentos que não se podem em absoluto quantificar, quanto mais exigir dinheiro por eles.
Perante os protestos e o evidente grotesco da situação, parece que afinal já não vai ser assim.
Percebem os meus visitantes por que é que há uns dias atrás me referi "à mediocridade da política acéfala" que nos tolhe a todos, os que têm filhos e os que não têm.
Sinceramente...não havia necessidade. Percebem agora porque me irrita alguma (muita) insensibilidade social da política formal para as questões de fundo. A política famíliar no nosso país deveria ser uma questão de fundo. Continua a ser injusto e até imoral a carga fiscal canina sobre as famílias portuguesas. O percentil e desconto em IRS de quem tem 1, 2 e 3 filhos é exactamente igual e só a partir do 4º filho desce um mísero ponto percentual. O que leva a que os lusofalantes disputem com o lince da serra da malcata o estatuto de espécie em vias de extinção. É só uma questão de umas poucas gerações a zero filhos/1filho por casal. Percebem agora os meus caros visitantes porque credito mais na política dos cidadãos...para os cidadãos.
A grande questão vai estar em como fazer esta revolução tranquila, sem o ruído e a algazarra dos comícios, os desfiles e arruadas da subserviência costumeira, de bandeirinha às costas, atrás do chefe, sempre de bacalhau estendido...ao incauto que passa. Nestes dias nem os bigodes farfalhudos das peixeiras da lota escapa a um beijo providencial, na hipocrisia mediatizada em que se está a transformar a política no meu país.
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