O monge corcunda do romance "O Nome da Rosa" de Umberto Eco foi a personagem que mais me marcou nessa famosa obra literária, passada magistralmente a cinema (1986) pelo realizador francês Jean-jacques Annaud. Chamava-se Salvattore, este monge corcunda, de dentição torta e aspecto asqueroso. Justificava-se " io stupido! Stupido!" e vivia à gosma de uma malga de sopa e de um bocado de pão, lá no mosteiro.
(ver resumo em http://tempore.blogspot.com/2006/01/o-nome-da-rosa.html)
Lembro-me bem do meu embaraço, perante as cenas quentes de outra personagem, o monge jovem com a menina ... ... nos aposentos vetustos daquele mosteiro, nesse filme, quando, no inicio da minha carreira docente, professor de História da Arte numa das escolas secundárias de Santarém, mostrava a película em VHS aos meus alunos (as), adolescentes, com as hormonas aos saltos. Queria, então como agora, praticar uma pedagogia inovadora e apelativa.
Queria motivar os meus alunos para o pensamento medieval e, concomitantemente, para a arte medieval, da qual a cidade Santarém é um dos expoentes máximos no nosso país, no que diz respeito à arquitectura. Recorria, para isso, a uma das manifestações artísticas mais importantes do século que já deixamos: o cinema.
Uns anos depois, sou interpelado nas ruas da cidade ribatejana por um jovem, o "Balau", arquitecto recém-diplomado, agradecendo o meu esforço realizado nessa arena em que está hoje transformada cada a sala de aula. Soube, em conversa curta, que outros ex-alunos se tinham formado, enquanto outros tinham rumado a Inglaterra, com carreiras de sucesso. Esse, foi dos raros momentos em que me senti realizado. Valeu apena o esforço e o "Nome da Rosa" foi só mais um elo na corrente com que nos amarramos e amarramos os outros às coisas do mundo.
Nos momentos em que escrevo este texto, Obama, presidente eleito da nação mais poderosa do mundo, passeia trinfalmente em Washington ao lado da sua bela esposa, à frente de um carro blindado-à-prova-de-tudo. Os americanos também são mesmo capazes de tudo. Até de por um homem na lua! Veio-me, estranhamente à memória (os insondáveis mistérios da mente humana) esse episódio escalabitano e a cena do Salvattore. Obama aparece, claramente, no imaginário norte-americano (e europeu!), como o Salvador de um modelo civilizacional em crise.
É justo, pela esperança maciçamente depositada, que lhe demos o beneficio da dúvida e que, já agora, ao contrário do outro Salvattore, não seja "stupido" e não caia nas garras dos falcões da guerra. O mundo precisa de paz, muita paz.
Paul Newman morreu no ano passado e fiquei-lhe a dever este requiem.
Ele que ganhou um Oscar já na fase final da sua vida e, ao receber a noticia, continuou calmamente o seu jogo de snoker, como se nada fosse. Outro qualquer desataria aos saltos.
A velhice é a melhor idade para tratar as recompensas.
Paul foi um magnifico actor e um grande aficionado das corridas de automóvel.
Recordará o cinema um cristalino par de olhos azuis e um talento invulgar para a arte dramática. Os actores têm esta sorte, a de serem recordados nas várias fases da sua vida.
O Newman jovem foi um actor de talento e um galã de Hollywood, mas o Newman da terceira idade produziu filmes bem melhores.Há artes que só mesmo o tempo a passar pelos seus protagonistas para lhes conferir uma grandeza inigualável.
Lembro-me dos grandes planos do realizador Sergio Leone, com os olhos de Clint Eastwood nessa épica coboiada chamada "O bom o maue o vilão" (que música! Que argumento!) projectados em scope no barrote de madeira do cinema da aldeia. Um casarão enorme de mil e uma portas funcionais, mas sem forro de tecto, podendo ver-se a estrutura do telhado e as telhas como se estivessemos num sótão, e entre elas outras estrelas a brilhar lá fora. Este foi o "cine paraíso" da minha infância.
De vez em quando lá se desprendia uma enorme teia de aranha, cruzando lentamente como um páraquedas, a cortina de luz, para gáudio da assistência, divertida com os imprevistos daquele espaço. Mágico, mesmo assim.
Paul e Clint tinham os olhos mais expressivos de Hollywood e os grandes actores, os que sabem usar a força do olhar, nem precisam de falar.
Bombas israelitas sobre palestinianos.
Entre terroristas barbudos mortos, com que se procura justificar a guerra, as inevitáveis vitimas inocentes. Vitimas "colaterais" com que o vocabulário bélico contemporâneo procura justificar estes assassinatos impunes. Sempre impunes.
E os funerais lá se fazem, com os corpos das crianças exibidos, ao alto, enrolados nas suas mortalhas cuidadas, transportados por multidões ruidosas, como santos de carne e osso em desordenada procissão. Corpos hirtos, eternamente adormecidos. Inocentes.
Se estas imagens, que nos entram pela casa dentro, via Televisão, são premonitórias do que aí vem. Começamos mal o ano. Muito mal.
Que respondo à minha filhota de 5 anos quando me pergunta "Para onde levam aqueles senhores aquelas meninas a dormir, papá?"
Que me dera que naquela Terra Santa acontecessem milagres de verdade.
Mas até ali, Deus parece adormecido, o dos Cristãos,o dos Judeus e o dos muçulmanos.
Morreu hoje o zé, "boby Sol" de alcunha.
Levei dele umas boas biqueiradas quando, sorrateiramente, procurava entrar e permanecer naquele mundo de adultos que eram os escassos cafés da minha aldeia, naqueles duros anos setenta, com as suas lustrosas e iluminadas music boxes onde, por vinte e cinco tostões, (se não me falha a memória) uma fortuna há época, podiamos ouvir os disco de vinil dos Stones, dos Creedence ou, em alternativa, do Roberto Carlos, mais fácil de entender para fazermos, em surdina, o nosso karaoke de então. Quando fiz os meus dezasseis anos comecei a fazer parte legal dos clientes dos cafés e tabernas da aldeia. Uma distinção. Acabaram-se os biqueiros e os puxões de orelha humilhantes.
O Zé foi um dos atletas do SCD, um pouco lento para avançado, mas temível pelo seu corpanzil, pela longa cabeleira da moda e pela atitude colocada em campo. Num célebre derby Glória - Samora Correia, aí pelos finais dos setenta, o arbitro não apareceu. Não tinhamos "fruta" para os árbitros e a Glória, então, ficava no fim do mundo. Mas, para quem gosta da sua terra, fica no centro dele.Quem apitou o jogo foi o meu saudoso tio João Charréu que, logo, inventou um penalty a nosso favor. O amor incondiconal ao clube da terra dava nisto. Os jogadores do Samora em reboliço, mas o penalty lá foi marcado.
O guarda-redes no seu momento privativo de angústia e os adeptos da clube da casa, num raro momento de clarividência e justiça, pedem ao Zé Boby Sol que não marque golo. Queriamos ganhar, mas com jogo limpo. Ah estes manganões utópicos!
Zé corre para bola e, com toda a calma do mundo, perante o guarda-redes petrificado, atira devagarinho pela linha de fundo. Protestam agora os da casa com o seu avançado perante a indiferença altiva do Zé. Fez o que achou correcto.
O jogo continua empatado a zero e rijinho até à (***) canela (***), a arbitragem continua "fabulosa", até que, em protesto, os de Samora abandonam o campo. Lembro-me bem das suas camisolas em xadrez, "à Boavista". Ganhamos na secretaria por três a zero.
Passadas umas semanas visitamos o Samora-Correia e, também com um árbitro "lá da terra", levamos uma cabazada monumental.
Mas a melhor cena do zé ficou guardada para quando deixou de jogar futebol. Continuou adepto incondicional do seu "Benfica" e nos anos oitenta faziam-se e excursões à Luz onde facilmente as lotações atingiam os 120 000 adeptos. Ainda que possa parecer mentira. (Não havia tanta televisão e o Benfica jogava bem melhor). Num célebre jogo Europeu, quando estádio já estava perigosamente cheio que nem um ovo, entre bilhetes legais e bilhetes falsos, a policia barra a entrada aos rurais que já tinham comprado honesta e antecipadamente o seu bilhetezinho.
E o Zé que tinha comprado o seu ficou do lado de fora com o pequeno rádio a pilhas colado ao ouvido para ouvir o relato. Do locutor "senhores ouvintes, iniciamos a nosso relato desde o estádio da luz, completamente cheio com120 000 espectadores".
Protesta o Zé, "120 000 não! 119 999, porque eu paguei bilhete e fiquei de fora".
Acho que o Benfica ganhou aquele jogo, para desagravo e para sarar aquelas mágoas momentâneas.
O zé último que conheci era um esqueleto vivo roído pelo alcóol e pela doença. Não sei se andava ou se era empurrado pelo vento, entre a indiferença aldeã que se costuma devotar aos desgraçados.
Adeus Zé. Paz à tua alma.
Fala desse jogo com o meu tio, se puderes.
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