Foi na noite de terça para quarta.
Paula Moura Pinheiro, "pivot" do programa Câmara Clara" da RTP2 e Gabriela Canavilhas delegada do Ministério da Cultura na RA dos Açores, dissertavam sobre a cultura nas ilhas, com dois senhores lá do sítio, muito entendedores . Do que disseram não me lembro nada, da beleza das senhoras lembro-me de tudo...
Comemora-se hoje o dia nacional de França, país que aprendi a amar desde há muitos anos.
Iniciado na cultura francesa pela aprendizagem da língua, nas aulas de Francês da professora Maria da Luz, na saudosa escola Secundária da RARET, que marcou gerações de glorianos e glorianas, fui depois, descobrindo por mim próprio, ou induzido pelo circulo intelectualoide das Belas Artes do Porto, os poetas malditos: Artaud, Rimbaud, Baudelaire, a filosofia delicada de Bergson a escrita inolvidável de Malraux e de Saint-Exupery, para não falar nos magnificos e revolucionários impressionistas.
Aos vinte anos, um choque, irreparável, com a xenofobia francesa em terras além-pirenaicas.
Raramente vi tanta boçalidade e estupidez juntas como ali, naqueles lugarejos do sul de França onde, trabalhando em quintas agrícolas, procurava amealhar algum para pagar a faculdade naqueles finais de oitenta dificeis.
A ideia de que uma nação se espelha nos seus artistas é verdadeira, mas, tem.... nuances.
Pois aqueles franceses campónios deitavam sons pelo fundo das costas... ao balcão dos cafés, na fila do supermercado, na rua, e para além disso, com a maior descontração do mundo. Um concerto fedorento.
A irritação de ouvir e ver um casal de velhotes espantarem-se, numa praia de Biarritz, com o facto de em Portugal também haver faculdades, só foi ultrapassada, anos mais tarde, pelo roubo de catedral que um senhor árbitro (Marc Bata, de seu nome, lembram-se?) para com a nossa selecção e para com esse elegante principe do futebol que foi Rui Costa, expulsando-o do jogo, quando se dirigia para o banco de suplentes para ser substituído. Um escândalo e uima afronta inesquecível para quem ama o desporto rei.
Vinguei-me dos franceses com algumas tropelias suaves, como viajar constantemente em primeira, (incluindo uma célebre viagem TGV entre Paris Austerlitz e Lyon Perrache) com bilhete de inter-rail (que só dava para segunda) e fingir que não falava um corno de francês, para me safar da situação, quando o cansaço e o sono permitia sermos apanhados pelos senhores revisores da SNCF, escarrapachados nas poltronas magnificas das carruagens de primeira dos comboios franceses, sonhando com um dia em que os políticos de todos os países obrigariam todos os jovens a viajar gratuitamente pelo mundo... para se tornarem melhores cidadãos. Sonhar não custa "Alllons enfants...le jour de gloire est arrivé".
PS: Hoje estou de férias, por isso tive tempo para dois posts
Enfim... recriamos no nosso festival de folclore um casamento d´antigamente, daqueles que a rapaziada da minha geração ainda assistiu, podendo também fazer a comparação - com conhecimento de causa - com os exóticos e industriosos casamentos de hoje, servidos (ou não) por empresas externas, como os catterings, de facto muito "in", ou por mega restaurantes, mais ou menos especializados e que o ministro Teixeira quer muito justamente taxar, por pensar, com muita esperteza (por isso chegou a ministro), que aí circulam muitos milhões de aéreos fora de controlo.
Mas os noivos de hoje são uns pequenos príncipes mimados, com direito a uma viagem às caraíbas, ou, para quem não gostar da turbulência tropical, à terra do incorrigível Alberto "o desbocado".
Hoje, a fartura de marisco também já substituiu as bananas, definitivamente sem estatuto, após o baixo preço comercial lhe ditar o destino de "fruto dos pobres", quando dantes era o fruto dos riscos. Nada de espantar, pois ao bacalhau já aconteceu o mesmo, nos flops extraordinários da economia.
Mas dantes não era assim. O casamento na Glória começava uma semana antes e acabava uma semana depois. Os rituais dos familiares, as reuniões cordatas, em "casa com forno", as "procissões" das mulheres, com os enormes avios, a cozedura dos bolos de vários tipos e tamanhos (de erva doce, "do papelinho", pãos-de-ló, de todos os tamanhos e feitios, etc.) atraía a pequenada, como um íman, reforçado pelo cheiro inconfundível da doçaria fresca no ar.
Valendo-me da minha condição de menino, ia-me introduzindo nos quintais com ambiente casamenteiro e a solidariedade e o carinho com que outrora os mais velhos devotavam aos mais novos, tinha uma correspondência recíproca (pelo menos até à adolescência!). Assim, ía aos casamentos da família e era tolerado nos casamentos da vizinhança. Um luxo.
Apreciava, com particular atenção, a "edificação" do bolo da noiva, em pão de ló, de vários andares, decrescentes, barrado com creme feito com claras de ovo, em castelo, polvilhado com reluzentes bolinhas prateadas. Um prodígio arquitectónico a fazer lembrar as pirâmides do Egipto, mas sob o redondo. Este monumento não estava ao alcance de qualquer mão e ter uma mulher capaz de levantar uma obra destas era altamente apreciado nas familias. Era por si só um espectáculo assistir a este transporte, para a casa da boda: a madrinha, altiva, o bolo resplandecente, levado à cabeça, e a pequenada em turbilhão pelas ruas da aldeia de olhos postos naquele pedaço de doce supostamente celestial.
Chegado o dia, com a concertina entoando no ar as melodias costumeiras, lá se dirigia a comitiva em alegre reboliço para a igreja. Mas uma das partes mais inesquecíveis de todo este ritual, que hoje recordo com saudade, estava reservado para a parte final do casamento. Saídos da igreja os noivos e submetidos à fotografia da praxe pela "máquina de enfiar a cabeça", as madrinhas desatavam a atirar amendoas para a turba esfomeada, que impacientemente esperavam esta dádiva regular, a única goluseima para muitos.
Havia uma estúpida convicção, entre a pequenada, que as amendoas cor-de-rosa, verdes ou azuis, eram mais doces do que as de cor branca e lembro-me bem das lutas titânicas, dos empurrões e das rasteiras, para poder apanhar, do chão, entre terra, pó, pedrinhas e caganitas de cabra, o maior número de amendoas coloridas que pudesse. Quando mais ricas as posses dos familiares dos nubentes, mais amendoas esvoaçavam pelo ar. Um fartote.
Em chupanços prazenteiros vagarosos, entre dentes, íamos desgastando, lentamente, a parte cristalizada até à "plocha" de amendoim, o clímax final daquele prazer gustativo arqueológico.
No outro dia, atirei dois sacos de amendoas para o lixo. Tinham passado o prazo e hoje há guloseias mais competitivas para os pequenos principes e princesas que mimamos todos dos dias. Não sei se crescer assim, com muito, é mais saudável do que crescer com pouco, mas num certo sentido, gostei muito de crescer com pouco.
Leonardo Charréu, Évora, 14 de Julho de 2009
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