Segunda-feira, 14 de Abril de 2008

Made in RDA

Por vezes temos que passar por algumas experiências para poder dar mais sentido e valor às novas. Nos meados dos anos oitenta comprei, a prestações (!) uma máquina de escrever “Made in RDA” de cor azul cinza, num estojo preto, anti-choque. Este foi então um extraordinário património para um rapaz da aldeia, que se cultivou numa carrinha Citroen, de chapa ondulada que vinha cheia de livros, de tempos a tempos, ao centro da terreola “trazer o mundo”. Na chapa lateral “Fundação Gulbenkian Biblioteca Itinerante”. E lá dentro, um cheiro quente a livros que não mais esquecerei.

Enquanto os meus companheiros iam deixando a escola e oleando e limpando com desvelo as famosas Famel Zundapp XF17 Super, compradas a setenta e cinco contos (!) com as primeiras sofridas economias do trabalho, na construção civil, eu ia oleando, com igual devoção, a minha máquina de escrever.

Pouco tempo depois, num viagem épica a Andorra que, juntamente com a norte- africana Ceuta, constituíam as cidades santas das compras, “a um terço do preço”, da minha juventude, completei o meu património “Made in RDA” com uma máquina fotográfica  Praktica Reflex MTLB5. Julgo, sem grande erro de me enganar, que milhões de fotógrafos se devem ter formado neste aparelho, com o qual tirei as minhas melhores fotografias até hoje.

Para os meus visitantes mais jovens, menos conhecedores da geopolítica europeia que marcou a geração que já vai nos quarenta, a RDA é o acrónimo de República Democrática da Alemanha, na altura em que uma cortina, que alguns diziam ser de ferro, separava os países comunistas da Europa livre.

Era um país que aberbatava a maioria das medalhas em competições desportivas, sabendo-se hoje a razão porque as suas atletas tinham “voz de homem”. É que na RDA proliferavam os mais importantes laboratórios de substâncias dopantes.

Bom, voltando à inspiração deste texto, a facilidade com que agora nos metemos no meio de um texto (sem o arreliador corrector branco), o deixamos a “adormecer”, para logo depois voltar a ele…é uma capacidade extraordinária que só quem dactilografou mecanicamente sabe dar valor.

Delas só tenho saudade do tap tap, e do rrrrt da mudança de linha. Dava-me um certo estilo de personagem policial, a escrever os relatório das detenções, momento complementar à fúria do gatilho, das séries televisivas “Serpico” e “Bareta” da nossa única televisão. Enfim, para além da revificação das memórias pessoais, senti mesmo o suplemento de alma de que necessitava.

  A propósito, troco uma tela minha de dimensões razoáveis de 80 x 60 cm (sobre esta temática) por uma máquina de escrever Remington mesmo em mau estado. Ficava-me bem em cima do aparador.


publicado por ensinartes às 01:55
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